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Um diário trasladado

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13
Out17

Sócrates e o Bosão de Higgs


Eremita

O Valupi pergunta: "quem tem medo dos factos?" Eu preferia "desfulanizar" e perguntar primeiro como um facto constitui prova num caso de corrupção, porque a dúvida é genuína. Já apanhei de ouvido que é muito difícil produzir prova em casos de corrupção. Admitindo a inexistência de um vídeo que capte um acto de corrupção activa de Salgado a Sócrates, o que pode constituir prova? Várias denúncias concordantes? Uma acumulação de factos suspeitos, como transferências bancárias explicadas com recurso a coincidências? Ora, para uma coincidência podemos estimar uma probabilidade. Até quantas coincidências resiste a credulidade de um homem, então?

 

Mesmo a experiência que sustenta a descoberta do Bosão de Higgs e foi unanimemente aceite pelos físicos e celebrada no mundo inteiro não nos deu uma certeza absoluta, porque tem um valor de P de 3x10-7. O que isto quer dizer é que a probabilidade de observar os mesmos dados da experiência sendo o Bosão de Higgs inexistente é de 1 em cerca de 3.5 milhões. Começar a discutir o problema da indução a propósito da acusação a Sócrates é ridículo, mas seria útil que os defensores da tese da conspiração política dissessem o que seria necessário para os convencer da culpabilidade de Sócrates. Se não o fizerem terão a credibilidade dos charlatões que promovem teorias pseudo-científicas, impossíveis de testar, pois é óbvio que até a incerteza associada a um valor de P de 3x10-7 usarão como argumento. Digam lá o que seria suficiente para vos convencer. Quem tem medo das hipóteses?

 

6 comentários

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    Eremita

    13.10.17

    Valupi, experimenta reler o que escrevi, porque a tua resposta é das coisas mais absurdas que tenho lido. Só referi o uso da estatística na ciência para frisar, pelo contraste, que na justiça não existe uma forma objectiva de definir o que se entende por "dúvida razoável". É essa a questão. Claro que sou pelos princípios que referes, mas o problema permanece. O que é a dúvida razoável? A pergunta ganha pertinência quando o acusado é uma figura tão polarizadora como Sócrates. Tu, por exemplo, consegues alimentar as tua dúvida razoável com uma análise sem pés nem cabeça da forma como os advogados de Sócrates fazem declarações à imprensa.
  • Sem imagem de perfil

    Valupi

    15.10.17

    Experimentei reler o que escreveste. Descobri que tens um título onde relacionas o bosão de Higgs com Sócrates. Ironia? Que nada, analogia. Pegas no conceito de probabilidade tal como se aplica na ciência experimental para vires desafiar os malandros que se agarram às conspirações políticas para não concordarem contigo. É que tu estás aí com o pistola anti-charlatães pronta a disparar enunciados estatísticos para vergar essa gente às tuas hipóteses favoritas. Um dia a Justiça será tal como a imaginas para lidar com este famoso corrupto, um cálculo automático sobre a inocência ou culpabilidade provável de cada um de nós. É que nem precisaremos de ir a tribunal, as penas serão despachadas automaticamente e, na maior parte dos casos, remissíveis a pagamentos pelo Multibanco.

    O que escreveste é engraçado, pelo lado do disparate. Mas há um outro lado assustador, aquele em que te colas a um processo judicial que prendeu para investigar, e que investigou para confirmar a hipótese da culpabilidade. Talvez um dia, se acontecer o mesmo à tua pessoa ou à de alguém importante para ti, compreendas que a invenção da Justiça não tem essa finalidade, ao contrário - foi contra esse arbítrio do mais forte que se caminhou ao longo de milénios para o estabelecimento dos direitos e garantias dos mais fracos, os cidadãos no confronto com o Estado e seus poderes coercivos.

    Quem prefere a decisão justa não tem pressa em condenar e penalizar arguidos. Qual é a pressa? Mas mais: é preferível deixar escapar mil criminosos a condenar um inocente. Pertenço a este último grupo de amantes da liberdade.

  • Imagem de perfil

    Eremita

    15.10.17

    Não, não pego. Podemos até retirar o bosão do post, sem perturbar o essencial, que é a pergunta que formulei. Curiosamente, ainda ninguém respondeu a essa simples pergunta.

    Também não vale a pena dramatizares, não estamos numa jantarada na Guarda. Quanto à fuga ao segredo de Justiça, estamos de acordo e eu nem sequer comentei este caso antes de haver acusação, pelo que podes guardar toda essa grandiloquência sobre o amor à liberdade para o João Miguel Tavares. O que te faz pensar que amas mais a liberdade do que eu ou qualquer outra pessoa?

    Agora que há uma acusação, podes fazer de advogado de Sócrates e dizer que não há a menor razão para suspeitas, mas garanto-te que qualquer amigo teu te dirá que fazes uma triste figura. Quanto a condenações sumárias, também não percebo a tua preocupação, pois eu não me apressei a condenar ninguém. As muitas dúvidas que este caso suscita precisam de ser esclarecidas durante o julgamento, nada mais. Eu até hiperbolizo ainda mais a expressão original, Valupi: é preferível deixar escapar 10 000 mil criminosos a condenar um inocente. Mas a pergunta sobre a dúvida razoável mantém-se. O que seria para ti suficente e necessário mostrar para que Sócrates fosse culpado?

    A discussão evoluiu. Há uma acusação. Se o Ministério Público forjou provas, ocultou factos para parecer mais convincente, teve qualquer outro comportamento indigno (além de contribuir para a fuga ao segredo de justiça) ou simplesmene avançou uma tese fantasiosa para ver se cola e não perder a face, a defesa de Sócrates terá a oportunidade de desmontar a acusação, fazer um brilharete e humilhar o MP. Veremos.
  • Sem imagem de perfil

    Valupi

    15.10.17

    Mesmo em Nuremberga, os militares nazis sujeitos a julgamento continuaram a ter direitos. Vários. Entre eles, o de falarem na sua vez de falar. Fosse para responder ou alegar. Porque é essa a prerrogativa civilizacional pela qual os estivemos a julgar, a nossa superioridade. Nós, a comunidade que prefere a complexidade, morosidade, custo e risco de se darem direitos e garantias aos arguidos e se procurar uma justiça cega e uma justiça justa. No que escreves, parece-me que não fazes a mínima ideia do que esteja em causa no conceito de "processo justo" e qual a sua importância.

    A pergunta que fazes só tem uma resposta, óbvia: a dúvida razoável é o que cada um quiser que seja. Pelos vistos, não sabes nem imaginas que quando se produz uma sentença judicial estamos perante um exercício de convicção.

    Já formaste a tua convicção em relação às suspeitas que recaem, e legitimamente, sobre Sócrates? Se sim, jamais te escolheria para jurado num tribunal e recomendaria que te impedissem de exercer qualquer tipo de magistratura.
  • Imagem de perfil

    Eremita

    16.10.17

    Para ver se nos entendemos, porque começamos a andar aos círculos. As fugas ao segredo de Justiça foram uma sacanice inadmissível. Não foi justo. Mas a menos que te pareça que fugas ao segredo de justiça são suficientes para invalidar qualquer processo (uma posição que acabaria com a Justiça, pois as fugas passariam a ser feitas pela defesa), é tempo de avançar. Ou será que pretendes passar os próximos 10 anos a escrever sobre a ignomínia das fugas ao segredo de Justiça?

    Quanto ao "falarem na sua vez de falar", é extraordinário que o escrevas poucos dias depois de Sócrates ter tido uma hora de quase-monólogo no horário mais nobre da televisão. Sócrates e as outras estrelas deste processo têm, ao contrário do cidadão comum eventualmente vítima de uma fuga ao segredo de justiça, todas as oportunidades de falar; se alguns, ao contrário de Sócrates, desapareceram do espaço público, foi por vontade própria. E se nos lembrarmos do modo como Sócrates tentou silenciar algum jornalismo quando tinha o poder, a tua defesa da voz dos mais fracos fica algo caricata.

    Reparo que respondes à minha pergunta com uma evasiva. Tem sido o estilo da defesa de Sócrates e é parte do problema. Por que motivo o "caso Medina" da compra de um duplex não durou uma semana? Porque não havia caso e Medina deu uma explicação convincente, sustentada em documentação. O problema de Sócrates é a ausência ou implausibilidade das suas explicações. Diz-me, Valupi, as interacções monetárias entre Carlos Santos Silva e Sócrates, já por este admitidas, parecem-te normais? Responde a esta pergunta concreta sem evasivas, por favor.

    Quanto à minha convicção, já tinha escrito que não estou absolutamente seguro da culpa de Sócrates. Se a decisão dependesse de mim, hoje Socrates não seria condenado. Porém, eu jamais aceitaria ser jurado e invocaria falta de imparcialidade (por motivos pessoais). Já agora, tu aceitarias ser jurado, Valupi? Numa escala de 1 a 10, como está a tua imparcialidade esta manhã? Seja como for, um tribunal colectivo parece-me que seria mais credível do que um júri, dado o modo como se tem discutido este caso na praça pública.

    Em resumo, parece-me evidente que há dúvidas suficientes, demasiadas coincidências, factos suspeitos, declarações relevantes e comportamentos bizarros que só em julgamento poderão ser esclarecidos. Ou será que tu defendes que Sócrates não deve sequer ser julgado?
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