Palavras
Eremita
A R., que começou a terceira classe, disse ontem ao jantar "palavra-passe". O meu comentário saiu em tom de reprimenda, violando todas as boas práticas pedagógicas. Para mais, a miúda não tem culpa, limitava-se a mostrar o que aprendera na escola. E para agravar o meu caso, vi depois que os dicionários já consagraram "palavra-passe". Assumo a condenação pelo tom, mas ensaio a defesa da substância, não sem antes ressalvar que não sou um especialista. Não tenho qualquer aversão a contaminações vindas de outras línguas. Há estrangeirismos úteis e até inevitáveis, bem como neologismos resultantes de traduções literais ou menos ortodoxas que podem funcionar. Não defendo sequer um embargo a importações linguísticas quando já existem termos portugueses equivalentes. O critério que sigo não é proteccionista, é absolutamente meritocrático. Ora, existe na língua portuguesa um termo superior a "palavra-passe" (tradução literal de password): a palavra "senha". Na comparação com "palavra-passe", "senha" vence por três motivos: 1) não é uma palavra composta; 2) é uma palavra mais curta; 3) tem um significado mais preciso, pois muitas senhas não são necessariamente palavras mas sim associações de letras, números e outros símbolos, já para não falar das vezes em que são frases, como sucede com a senha mais conhecida de todos os tempos: "abre-te, sésamo".