Manuel Reis e a grande orfandade
Eremita
Depois dos obituários, a tese de doutoramento. Confesso que a li na diagonal, mas louvo a pachorra de João Pedro George. A extensão inusitada do artigo sugere que o sociólogo foi barrado à porta do Frágil, um trauma que marcou toda uma geração de boémios lisboetas nos anos oitenta e que nas últimas semanas ressurgiu na imprensa, primeiro como suor nocturno e raiva atávica, de que é exemplo este artigo de João Miguel Tavares, e agora como sublimação sociológica, perante a incompreensão do resto do país e até da malta que, como eu, frequentava sobretudo o Hot Club. George estabelece um paralelo entre a geração do Frágil e a que combateu nas ex-colónias, mas enquanto trauma devemos obviamente dar à guerra, com os seus corpos esventrados e experiências-limite que revelam heróis e cobardes, uma importância que uma nega de porteira de bar não merece. Enfim, o paralelo é menos absurdo do que sugiro. Toda a comoção com o desaparecimento de Manuel Reis revelou que a geração que começou a sair à noite nos anos oitenta (a minha) é órfã da História e precisa de a inventar com o que houver.