A mão no leme
Eremita
Será possível traçar uma bissectriz virtuosa entre Rui Ramos e Rui Tavares? O primeiro demonstra que os conservadores são capazes de esquecer o pessimismo antropológico, pois escrevem sobre o racismo com uma retórica pós-racial cega, lírica e tonta, que lhes dá imenso jeito para manter o status quo. Não, o problema não é só a pobreza. O Dr. Ramos que explique como se consegue assegurar igualdade no acesso ao arrendamento a famílias negras de classe média sem beliscar o sacrossanto direito à propriedade privada. O segundo, com uma retórica estafadíssima, faz uma defesa tímida do relativismo, como se usar o exemplo das visões absolutistas e incompatíveis das religiões do livro não fosse primário e a mutilação genital feminina pudesse ter outra interpretação que não o repúdio absoluto e incondicional. A tensão criada por duas visões irreconciliáveis não se resolve facilmente com uma adversativa, que aqui soaria a dobradiça enferrujada. Mais do que a peer pressure, temo o desgaste do tempo, que pode redundar em letargia ou precipitação. Vejo a reflexão sobre estes temas como uma viagem de longo curso em mar aberto (sem bombordo). Não nos indignemos em exibições de virtude antes de chegar a terra firme*.
* Se antes imaginava estes remates grandiloquentes como se falasse para uma plateia a perder de vista, agora a ilusão é pensar que um dia as minhas duas meninas lerão o que o pai escreveu. Se fosse um intelectual francês, descreveria esta mudança que não muda a aparência como a domesticação da mania das grandezas.