A COVID-19 nos EUA e a única certeza
Vasco M. Barreto
Tenho lido e ouvido comentários curiosos sobre a evolução da COVID-19 nos EUA. Alguns já concluíram que o país lida agora muito melhor com a COVID-19 porque o aumento no número de testes positivos por dia não se traduz num aumento no número de mortes por dia. Ouvi também duas explicações: que a capacidade de resposta entretanto aumentou e que a doença já vitimou os mais vulneráveis, pelo que a proporção de casos benignos, que sempre foram a vastíssima maioria, terá aumentado. A primeira explicação pode ser válida. Mas a segunda é improvável. Basta pensar que os EUA são um país de dimensão continental. O aumento no número de casos tem ocorrido em Estados que não lidavam ainda com a doença quando a COVID-19 fazia estragos em Nova Iorque, ou seja, em populações que não foram ainda seleccionadas pela COVID-19. É também preciso fazer umas contas complicadas para decompor o impressionante aumento no número diário de casos desde 19 de Junho na parte que corresponde ao aumento da epidemia e na parte que resulta do aumento do número de testes por dia, que também aumentaram consideravelmente ao longo do tempo. Parece evidente que estas duas componentes existem, porque o aumento no número de testes positivos não se explica pelo aumento no número de testes, bastando sobrepor as curvas .
Em todo o caso, estas conclusões sobre a COVID-19 revelam que não aprendemos nada com esta experiência. A ansiedade, o optimismo excessivo ou o negacionismo continuam exuberantes. Como decorrem 2 a 8 semanas entre o momento em que a doença é detectada e a morte dela resultante, só agora deveríamos esperar um aumento no número de mortes correspondente ao aumento no número de casos positivos desde 19 de Junho. E se compararmos a evolução da média de mortes nos últimos três dias, verificamos que para encontrar um valor mais alto do que o de ontem temos de recuar a 12 de Junho. Só nas próximas semanas saberemos se estamos no início de um novo aumento do número de mortes por dia. A única certeza é esta: haverá sempre alguém que continuará a concluir coisas com a convicção, o espanto e a ligeireza de um desmemoriado.