UMA SOLUÇÃO PARA AS DESIGUALDADES SOCIAIS
Meus amigos,
Chamo-me Fausto Gomes e todos os domingos darei aqui, neste espaço de liberdade que é o Ouriquense, o meu contributo para um Portugal mais justo e um Interior mais próspero. Decidi começar de um modo que, simbolicamente, cumpre estas duas ambições: uma ideia de um alentejano para o seu país, que ultrapasse o Alentejo mas não perca o seu cunho fundador, ao ponto de um dia todos dizerem "hoje vivemos melhor por causa do Fausto de Ourique". Porque ao Interior não podemos apenas pedir produção agro-pecuária, turismo rural, energias alternativas e moças saudáveis de faces rosadas. Não. Precisamos de ir das alfaias agrícolas às alfaias do pensamento. Eu quero searas de ideias ao vento e ver em cada ceifeira-debulhadora um think tank.
A minha ideia é simples, como é próprio das boas ideias. O comunismo falhou. Falhou porque não estimula a competição, porque limita a liberdade e porque é muito vulnerável a tentações ditatoriais. Mas estas são apenas manifestações do problema de base do comunismo: a sua desadequação à natureza humana. Pois bem, a minha ideia resolve esta incompatibilidade. Não tenho um novo esquema de organização da sociedade. Limito-me a propor um tecto salarial para todas as profissões, no Estado e nas empresas privadas. O valor máximo é um detalhe que deixo ao cuidado dos técnicos, embora 10 000 euros brutos me pareça acertado e sonoro. O essencial é explicar a novidade que esta ideia traz e as suas implicações.
O problema do capitalismo é o contrário do problema do comunismo: falha por ser excessivamente compatível com a natureza humana. Por outras palavras, o capitalismo não pode funcionar porque os homens são imperfeitos - este argumento convence os críticos do capitalismo, mas também qualquer adepto do pessimismo antropológico. A solução é, em suma, uma síntese: combinar o que o comunismo e o capitalismo têm de bom, deixar de fora o que têm de mau. O actual Estado Social não foi uma síntese feliz.
É fácil entender um tecto salarial como uma medida comunista, pois o dinheiro poupado pode reverter para o Estado. Falta explicar a parte de capitalismo da medida. Aqui entra a novidade. Só é possível impor um tecto salarial se houver uma mudança de paradigma. Tal não passa por uma epifania colectiva, antes por ser consistente com a evidência de que, uma vez satisfeitas as suas necessidades básicas, aquilo que move os homens é o prestígio social, uma dimensão que o dinheiro deixa de mensurar em grande parte da escala. Os sinais estão em toda a parte: na profusão de prémios de carreira, de comendas, de títulos profissionais. E nada ilustra melhor a falta de valor real do dinheiro do que o ranking dos milionários que a revista Forbes publica: o que move os homens muito ricos não é o dinheiro, é a competição para ser o melhor. Logo, medir essa competição em dinheiro é, para qualquer sociedade, um mau negócio, que levou a absurdas assimetrias salariais e a uma desvalorização do próprio dinheiro à medida que se sobe na estratificação social. Se é assim, mais vale deixar os homens ricos a competir com dinheiro fictício. Eis o lado capitalista da solução. Até aos 10 000 euros de salário bruto, a sociedade continua a funcionar como até agora - o que não implica cortes salariais para uma vasta maioria. A partir dos 10 000 euros, o salário não deixa de aumentar, mas passa a ser simbólico. A competição não desaparerceia, antes pelo contrário, porque só jogamos monopólio pelo gozo de ganhar. Não só continuaria a haver uma uma Forbes, como o ranking da Forbes ficaria com um fulgor sem precedentes.
A ritualização dos combates foi uma das grandes conquistas dos animais e do homem. O capitalismo está assente num combate que falta ritualizar. Só assim se protegerá o valor do dinheiro e se promoverá uma ambição de pendor verdadeiramente humanista, em que a luta por chegar primeiro continua a ser cumprida, mas espezinhando menos. O meu nome é Fausto Gomes e eu aprovo estas ideias.