XIX
Eremita
Jonh Coplans
25.05.08 Foi com alívio que reparei no meu primeiro cabelo branco. Não custou nada, já passou. Agora podem vir os outros todos. Pensei que fosse acusar a passagem do tempo, mas percebo que apenas reconheço e tolero o acerto de contas que o tempo fez comigo. Porque é verdade que já tenho idade para cabelos brancos. A ilusão de juventude em que vivia, apenas interrompida pela lembrança dos aniversários, termina hoje e ainda bem, pois só me alienou.
Quando dei por ele, penteava-me com as mãos diante do espelho do balneário. Apeteceu-me arrancá-lo para o enclausurar num cubo de acrílico e o guardar por muitos anos com o zelo que um devoto presta a uma relíquia, mas pressenti que se o fizesse poderia ser mais tarde acusado de vaidade pois no museu das excrescências somáticas só toleramos verdadeiramente os exemplares que lá foram parar por iniciativa parental, como um dente em etanol ou o apêndice em formol. Ou melhor, como não consigo imaginar em que circunstância mostraria o cabelo a alguém, talvez tivesse receado que gozassem comigo depois da minha morte quando vasculhassem os meus pertences. Ai a posteridade, sempre a puta da posteridade.