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Jun10
XII
Eremita
John Coplans
25.04.08 Acompanhar as alterações no rosto de um homem que surgem com o envelhecimento é insuficiente para descrever a sua decadência física. O rosto está sempre presente e sempre exposto, pelo que só com os amigos que reaparecem ao fim de muitos anos podemos notar as mudanças. Também as pernas e os braços preservam uma relativa juventude e até a essência do corpo juvenil, apesar dos ginásios. É entre o pescoço e o baixo-ventre, sob a roupa, que têm lugar as alterações mais fiáveis. As mais óbvias são o aumento geral da volumetria, a mudança na qualidade da carne e da pele, os peitorais que se fazem mamas e o adeus dos abdominais que a barriga soterrou. Dêem-me um cadáver decapitado e de membros decepados e acertarei na idade do morto com um erro 3 anos. Mas feita a orografia do tronco, sempre sobra algo difícil de cartografar, que nenhuma lipoaspiração, nenhuma dieta, nenhum treino é capaz de retardar, talvez por estar tão fundo, não no corpo, antes na escala de complexidade. Um corpo é um conjunto de sistemas, que são um conjunto de órgãos, que são tecidos, que são células, que são organelos, que são moléculas, que são átomos, que são partículas. Vamos morrendo algures entre as células e as moléculas, e o tronco é o monitor que disso nos vai dando conta, como se Deus tivesse equipado cada homem com um poderoso microspópio electrónico e todas as manhãs o confrontasse com o seu destino final. Perto disto, as rugas do rosto são uma consolação.