Sí, lo confieso. Yo fui testigo del paso de Sara Carbonero por la facultad de Ciencias de la Información de la Universidad Complutense de Madrid (y ella del mío, aunque no se acuerde, todo sea dicho de paso). Y aunque yo terminé la carrera y ella no, lo cierto es que su vida le ha ido muchísimo mejor que la mía." María Jiménez, Tribus Ocultas
Eis um dos artigos mais extraordinários do ano, muito revelador dos tempos em que vivemos. Como explicar esta extraordinária demonstração de inveja nua numa sociedade que inventou a expressão "envidia sana"? Não é possível saber se a autora é mais estúpida ou muito mais inteligente do que o cidadão comum. A plena assunção pública da inveja, do ressentimento ou até da frustração só não tem uma dimensão de kamikaze porque aos pobres jovens japoneses que deram a vida na tentativa de afundar a armada norte-americana não era dada outra opção. O voluntarismo do gesto de María Jiménez quebra uma convenção social, que é o pudor com que censuramos a derrota no espaço público. À sociedade interessam os derrotados a quem conseguimos associar alguém vitorioso, como sucede nos jogos e em todas as competições explícitas, pois não há vencedores sem vencidos. Mas quando o vencido tenta ganhar protagonismo, violando a sua condição de figurante imprescindível e efémero ao assumir-se como derrotado numa competição que só ele sente e a só ele importa, quebra uma regra não escrita e gera um desconforto difuso.
María JIménez sentiu um pico de fama, ainda que na condição de criatura infame, pois o artigo que escreveu será o que mais visualizações terá em toda a sua carreira mediana. Nesse sentido, terá sido inteligente e ousada. Só que o gesto fez dela a ressabiada suprema. É possível que o grau de inteligência pouco explique. Há em Maria Jiménez um derradeiro desespero combinado com ambição que lembra Heróstrato, o pirómano grego disposto a destruir uma das sete maravilhas do mundo só para ficar a qualquer preço na História. Mas se ainda hoje nos lembramos do grego apesar dos esforços das autoridades de então em fazer esquecer o seu nome, Jiménez não foi suficientemente longe no seu desespero. A actualidade muda tão depressa que ninguém se lembrará de María Jiménez daqui a uma semana. Até do nome do assassino de John Lennon já poucos hoje se lembram.
Sara Carbonero foi colega de Maria JIménez na faculdade. Há algum anacronismo no artigo, pois a faculdade já não é - nunca foi, aliás - garantia de sucesso para ninguém. De certa forma, uma colega de Carbonero no liceu, na primária ou na creche poderia ter esrito o mesmo artigo. Em algum momento nos cruzamos na vida com alguém que virá a ser muito mais famoso e bem-sucedido do que nós e é inevitável que as perguntas nos ocorram: o que fez ele para merecer o que eu não consegui? O que não fiz eu para não ter o que ele tem? Dependendo da personalidade de cada um, este é um exercício que nos pode deixar deprimidos ou indignados. Como, então, nestes tempos em que a fama se busca pela fama e os likes e as "visualizações" transformaram tudo em métrica, podemos evitar a depressão ou a indignação?
Existe a hipocrisia, claro. Na MPB, parece que todos os músicos brasileiros se adoram, mas tamanha magnanimidade, falsa ou genuína, só acontece a partir de um grau mínimo de sucesso, ou seja, entre elites. Precisamos pois de estratégias ao alcance de todos. Não sendo o Ouriquense um blog de personal coaching, abro uma excepção e ofereço-vos duas estratégias. A primeira: cultivarás um estilo. No magnífico Os Passos em Volta, Herberto Helder lembra a importância do estilo. O estilo é uma couraça que nos protege da comparação. O estilo está para a nossa sobrevivência social como a busca de um novo nicho ecológico para a existência das espécies. Se desenvolvermos um estilo que nos distinga, deixaremos de ser um daqueles carros uniformizados usados nas corridas em que apenas o talento para conduzir conta, e assim nos libertamos das agruras da comparação. Estilo. Modo de vestir, de estar, de ser, estilo de vida, uma constelação de interesses única que nos distinga. Mas é preciso mais. Eis a segunda estratégia: serás megalómano na inveja. Invejem em grande. Invejem apenas os que estão distantes no tempo, de preferência mortos, ou aqueles que estão longe no espaço, de preferência em alguma estação orbital. Não invejem os colegas de faculdade, os colegas com quem partilham o escritório, o tipo mais brilhante do vosso local de trabalho. Invejem Einstein, Leonardo da Vinci, a Cleópatra... A inveja megalómana é uma das raras combinações de defeitos que se sublimam em virtude. Seguindo estas duas regras, nenhuma das colegas de liceu de Sara Sampaio será a próxima María Jiménez.