Como pensa uma operadora de caixa? Antes da obsessão por Tatiana, a minha memória não individualizava operadoras de caixa. Mesmo faltando um uniforme, o limitado conjunto de gestos e a brevidade do encontro transformava a operadora num robô que nenhuma troca de saudações chegava para verdadeiramente humanizar. Este modelo de interacção só era perturbado por uma qualquer rara idiossincrasia: um piercing no nariz, uma tatuagem apenas parcialmente escondida, um comentário espirituoso. É possível que para esta visão da operadora de caixa contribua algum preconceito de classe. Mas se o cliente tem uma posição hierárquica superior à da operadora de caixa, pela própria circunstância de ser cliente - "...tem sempre razão"-, é inegável que a operadora de caixa tem a melhor posição de observador.
Há umas máquinas que analisam populações complexas de células da seguinte forma: a população de células, em suspensão num meio líquido, é fraccionada em gotículas microscópicas, cada uma contendo em regra apenas uma célula. Essas gotículas formam depois um caudal descontínuo, que corre a grande velocidade diante de um laser capaz de registar as características físicas de cada uma das células, gotícula a gotícula. A isto chama-se citometria de fluxo. A operadora de caixa faz a mesma coisa a uma população de indivíduos. Podemos já não dizer "bicha", mas a fila de espera não deixou de ser um caudal descontínuo de gente, que a operadora de caixa avalia com olhos de laser. Este blog, real ou fictício, é uma boa ideia.