Polémica no Cineclube
Eremita
No Sábado passado noite assistimos a Man on Wire, um documentário sobre o funâmbulo que caminhou entre as duas torres gémeas, a centenas de metros do chão. Philippe Petit, o funâmbulo, fala sobre si próprio com um entusiasmo tal que as suas proezas são menos uma demonstração de coragem do que uma prova de egocentrismo. É essa a grande pecha do filme. Preferíamos ter visto um poeta, um louco ou um sonhador.
No fim do documentário discutiu-se a possibilidade de piratearmos o filme Che, que acaba de estrear em Lisboa. Pela primeira vez, ouviram-se insultos na sala. Não há "lei Barreto" que suture a ferida profunda da reforma agrária. Mas tinha razão a ala reaccionária, representada por duas raparigas ouriquenses muito bem apessoadas, que só aparecem por aqui aos fins-de-semana e transportam a aura irresistível da aristocracia decadente, o que transforma a tensão erótica que por elas sinto numa dupla traição - à minha paixão por Tatiana e à sua condição operária. Diziam estas jovens mulheres que Che foi um assassino, responsável por fuzilamentos sumários. É verdade. Aliás, Che continua a assassinar pessoas, de que é exemplo o recente fuzilamento de Benecio del Toro. O meu argumento, que colheu algum apoio, foi o de que é importante avaliar o grau de hagiografia do filme de Soderbergh em primeira mão. Ainda assim, uma das belas ouriquenses cosmopolitas lançou-me um esgar à Isabel Moreira e rematou entre dentes (disseram-me depois): "ainda bem que seu avô não o pode ouvir..." Pelos vistos sabe quem sou, embora eu não reconheça estas mulheres no meu passado. Esta curiosidade deixa-me levemente deprimido. E a subtil excitação ainda mais. Queria-me imune a qualquer outra mulher que não a Tatiana e estas duas têm um evidente potencial caprino. Concluo que já devia ter tombado Tatiana numa seara.