A racionalização era o meu ajustamento preferido e também o mais detestado. Se praticado por mim, tranquilizava-me; se praticado por outros em relação a mim, desesperava-me. Com os anos, aprendi que nunca se deve partilhar a nossa racionalização com a pessoa que a motivou. Mas aprendi também que ser exposto à racionalização da pessoa que a pratica em relação a nós é o caminho mais rápido para a libertação. Quando se começa a usar esta técnica, vai-se pois do desespero à melancolia e tudo acontece com a tranquilidade das rotinas. O único risco é abusar do expediente. Foi o que me aconteceu. Nos últimos tempos, a racionalização que ouvia do outro despertava em mim algo novo. Não voltara a ser desespero, nem era já melancolia, antes um sentimento mais conformado do que o primeiro e, na aparência, mais simples do que o segundo. Seria apenas a banal tristeza, se não houvesse uma consciência tão aguda de que era preciso recorrer a um qualquer outro ajustamento, o que me levava a pensar na sublimação, projecção, regressão, negação e sublimação como opções de um cardápio. Tal lucidez não apagava a tristeza, nem sequer lhe alterava a intensidade, mas mudava-lhe a natureza. Ao fazer radicar a tristeza na própria lucidez, a tristeza deixava de ter uma causa externa. Deve haver um nome para este ajustamento. Indexação egoísta? Usurpação defensiva? É algo que desumaniza e que não recomendo a ninguém. Enfim, tudo é relativo. Quando se fala em desumanidade, ainda nos devemos lembrar primeiro das catanadas no Ruanda.