Filha de Boaventura de Sousa Santos*
Eremita
A interferência do observador e da natureza do seu questionamento no estado e qualidade do seu objecto de estudo nunca foi tão amplamente reconhecida como nos séculos XX e XXI por todos os grandes nomes da física quântica e a própria realidade da consciência tem sido associada aos múltiplos factores que permitem definir e estudar o humano, quando a abordagem é sistémica (Análise Global de Sistemas): para muitos cientistas o ser humano não é apenas um conjunto de células em funcionamento, o seu psiquismo não emerge apenas do seu funcionamento cerebral e neuronal, a sua natureza não é apenas animal e a complexidade da sua termodinâmica (aberta, irreversível, espantosamente neguentrópica**) exige a formulação de outros quadros de experimentação, de outras metodologias, de outros imaginários de indagação e, portanto, de respostas com outros horizontes de referência.
Rupert Sheldrake, em Science set Free, 2013, assim como o recente manifesto para uma ciência pós-materialista assinado por mais de 300 cientistas, filósofos e investigadores doutorados de todo o mundo (http://opensciences.org/about/manifesto-for-a-post-materialist-science), denunciam os dogmas que limitam a ciência actual; por outro lado, um livro como o de Jean Andouze, Michel Cassé e Jean Claude Carrière, Du Nouveau dans l’Invisible, 2017, permite enriquecer o debate sobre a natureza profundamente perigosa e eugenista do projecto transumanista que está a ser imposto ao mundo, em nome do progresso científico. Leonor Nazaré, curadora de arte contemporânea, Público.
* O eminente sociólogo publicou, em 1987, um livrinho anti-positivista que deu muito que falar. Chama-se Um Discurso Sobre as Ciências.
** O uso do hipertexto para explicar palavras potencialmente difíceis não deve ser interpretado pelo leitor como desconsideração. O Ouriquense é um espaço plural que tanto atrai amantes de rumbas iliteratos, com aversão à álgebra e viciados em candy crush como mestres xadrezistas que declamam Antero de Quental de cor, resolvem problemas de topologia para adormecer e só ouvem autores dodecafónicos. Naturalmente, nivelamos por baixo.