Não há choros grátis
Eremita
Jacques? Jacques Brel? Fuck you.
Certo dia, numa cidade muito longe de Ourique, visitei um daqueles psiquiatras que têm o consultório decorado à Freud. A sessão correu mal, mas salvou-se no derradeiro instante. Para rentabilizar o negócio, na América é habitual o consultório de psiquiatra não ter uma secretária que marque as sessões e receba os pagamentos. Não. Na América, os psiquiatras que eu podia pagar estendiam a mão no final da consulta para receber as notas sujas e engelhadas. Mas aquela era a primeira vez e eu ainda não sabia, pelo que a minha surpresa fez com que o psiquiatra frisasse a ausência do intermediário, num calão de Brooklyn que soou estranho no Upper East Side e me deve ter causado um irreprimível esgar anti-semita. Nunca mais esqueci aquele momento e o valor da transacção comercial. O consultório de psiquiatria é o único lugar seguro para se chorar acompanhado, porque o choro se cobra no próprio dia. Em qualquer outra circunstância, com um padre, com um amigo, com uma mulher, até com uma mãe, mais tarde ou mais cedo o choro partilhado será também cobrado, mas nunca no momento e nunca em dólares. Por outras palavras, sabemos que vamos pagar juros de mora, mas nunca sabemos quando vamos pagar e em que moeda.