O aprendiz do carrasco
Eremita
O homem equilibra a melancia pelo equador no cepo e ergue o machado com as duas mãos. A lâmina só não brilha porque o dia está enublado, mas percebe-se que brilharia à mais pequena aberta. O carrasco aponta dois dedos em forquilha na direcção dos seus olhos e diz algo inaudível ao rapaz, antes de erguer o machado. Desfere depois um primeiro golpe, um segundo e um terceiro, sem dar mostras de querer parar, aumentando inclusive a cadência. Ao fim de um minuto, sobre o cepo está uma melancia branca, sem uma única sobra de casca verde e sem que se note - pelo menos a esta distância - o vermelho vivo do interior. Em redor do cepo e sobre a sua superfície há inúmeras lascas de casca, finas como se alguém tivesse cortado uma pêra abacate com uma navalha. E nem a base da melancia escapou da lâmina, embora esteja ainda no mesmo lugar, não se percebendo daqui se o homem desferiu um golpe horizontal pela base tão rápido que deixou a melancia imóvel ou se a cada golpe a foi imperceptivelmente rodando sobre o seu ponto de apoio. O carrasco diz então ao rapaz: "quando fores capaz de fazer isto de olhos fechados, também terás direito a uma venda".